Queridos e amados irmãos e irmãs:
Seguimos nosso acompanhamento das catequeses semanais do Santo Padre, neste momento acerca dos santos e de toda a realidade da Idade Média. Segue a audiência do último dia 28 de outubro, em que o Santo Padre tratou do desenvolvimento da teologia monástica e da teologia escolástica. Aí se vê como as idéias realmente evoluíram durante a Idade Média, diferentemente do que pregam os que a tem por "Noite dos Mil Anos", ainda que sua circulação tenha sido dificultada especialmente pela situação das invasões bárbaras (primeiras e segundas) e caos que se seguiu.
Destacam-se os frutos da reforma gregoriano e a criação das Universidades (sim, surgiram na Idade Média!), métodos (como a quaestio), dentre outros. O Santo Padre seguedando conta dos maravilhosos frutos, tanto da teologia monástica quanto da escolástica, ressaltando nesta o maravilhoso equilíbrio entre fé e razão, e acaba por dar uma grande lição sobre a importância das dimensões afetiva e intelectual na vida cristã, no caso, na teologia. Expressamente: "Quando o amor vivifica a dimensão orante da teologia, o conhecimento, adquirido pela razão, alarga-se. A verdade é procurada com humildade, acolhida com estupefação e gratidão: numa palavra, o conhecimento cresce unicamente se ama a verdade. O amor torna-se inteligência e a teologia, autêntica sabedoria do coração, que orienta e ampara a fé e a vida dos crentes". Eram essas a vida espiritual e teologia belamente cultivadas na Idade Média.
Infelizmente, o mundo contemporâneo rompeu com o conhecimento da Idade Média, de modo que, na cultura popular, fé e razão possuem difícil conciliação... Rogamos ao Senhor para que aprendamos também nós a viver, orar e conhecer nossa fé segundo a fórmula supra, bem como para que a verdade sobre a Idade Média se estabeleça e que o nosso tempo possa retomar essa herança medieval e a desenvolva. Boa leitura!
Forte abraço a todos!
Manoel Guimarães,
Comunidade Paz & Mel.
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Detenho-me hoje a falar sobre uma interessante página de história, relativa ao florescimento da teologia latina no século XII, que se verificou devido a uma série providencial de coincidências. Nos países da Europa ocidental reinava então uma paz relativa, que garantia à sociedade desenvolvimento econômico e consolidação das estruturas políticas, e favorecia uma vivaz atividade cultural graças também aos contatos com o Oriente. No interior da Igreja sentiam-se os benefícios da vasta ação conhecida como 'reforma gregoriana', a qual, promovida vigorosamente no século precedente, tinha contribuído com uma maior pureza evangélica para a vida da comunidade eclesial, sobretudo no clero, e tinha restituído à Igreja e ao Papado uma autêntica liberdade de ação. Além disso ia-se difundindo uma vasta renovação espiritual, apoiada pelo vigoroso desenvolvimento da vida consagrada: nasciam e expandiam-se novas Ordens religiosas, enquanto que as que já existiam conheciam uma retomada prometedora.
Refloresceu também a teologia adquirindo maior consciência da própria natureza: apurou o método, enfrentou problemas novos, progrediu na contemplação dos Mistérios de Deus, produziu obras fundamentais, inspirou iniciativas importantes da cultura, da arte e da literatura, e preparou as obras-primas do século seguinte, o século de Tomás de Aquino e de Boaventura de Bagnoregio. Foram dois os ambientes nos quais se desenvolveram esta fervorosa atividade teológica: os mosteiros e as escolas das cidades, as scholae, algumas das quais deram depressa vida às Universidades, que constituem uma das 'invenções' típicas da Idade Média cristã. Precisamente a partir destes dois ambientes, os mosteiros e as scholae, pode-se falar de dois modelos diferentes de teologia: a 'teologia monástica' e a 'teologia escolástica'. Os representantes da teologia monástica eram monges, em geral Abades, dotados de sabedoria e de fervor evangélico, dedicados essencialmente a suscitar e a alimentar o desejo amoroso de Deus. Os representantes da teologia escolástica eram homens cultos, apaixonados pela pesquisa; magistri desejosos de mostrar a racionalidade e o fundamento dos Mistérios de Deus e do homem, acreditados com a fé, sem dúvida, mas compreendidos também pela razão. A finalidade diversa explica a diferença do seu método e do seu modo de fazer teologia.
Nos mosteiros do século XII o método teológico estava ligado principalmente à explicação da Sagrada Escritura, da sacra pagina para nos expressar como os autores daquele período; praticava-se especialmente a teologia bíblica. Isto é, os monges eram todos devotos ouvintes e leitores das Sagradas Escrituras, e uma das suas principais ocupações consistia na lectio divina, ou seja, na leitura pregada da Bíblia. Para eles a simples leitura do Texto sagrado não era suficiente para compreender o seu sentido profundo, a sua unidade interior e a sua mensagem transcendente. Portanto, era preciso praticar uma 'leitura espiritual', guiada com docilidade ao Espírito Santo. Na escola dos Padres, a Bíblia era assim interpretada alegoricamente, para descobrir em cada página, quer do Antigo quer do Novo Testamento, o que diz de Cristo e da sua obra de salvação.
Pelo contrário, a teologia escolástica – como disse – era praticada nas scholae, que surgiram ao lado das grandes catedrais da época, para a preparação do clero, ou em volta de um mestre de teologia e dos seus discípulos, para formar profissionais da cultura, numa época na qual o saber era cada vez mais apreciado. No método dos escolásticos era central a quaestio, ou seja, o problema que se apresenta ao leitor ao enfrentar as palavras da Escritura e da Tradição. Face ao problema que estes textos influentes apresentam, levantam-se questões e nasce o debate entre o mestre e os estudantes. Neste debate surgem por um lado os argumentos da autoridade, por outro os da razão e o debate desenvolve-se no sentido de encontrar, no final, uma síntese mais profunda da palavra de Deus. A este propósito, São Boaventura diz que a teologia é 'per additionem' (cf. Commentaria in quatuor libros sententiarum, I, proem., q. 1, concl.), ou seja, a teologia acrescenta a dimensão da razão à palavra de Deus e assim cria uma fé mais profunda, mais pessoal e, por conseguinte, também mais concreta na vida do homem. Neste sentido, encontravam-se diversas soluções e formavam-se conclusões que começavam a construir um sistema de teologia. A organização das quaestiones levava à compilação de sínteses cada vez mais extensas, ou seja, compunham-se as diversas quaestiones com as respostas que surgiam, criando assim uma síntese, as chamadas summae, que eram, na realidade, amplos tratados teológico-dogmáticos nascidos do confronto da razão humana com a palavra de Deus. A teologia escolástica tinha como objetivo apresentar a unidade e a harmonia da Revelação cristã com um método, chamado precisamente 'escolástico', da escola, que concede confiança à razão humana: a gramática e a filologia estão ao serviço do saber teológico, mas ainda mais está a lógica, que é a disciplina que estuda o 'funcionamento' do raciocínio humano, de modo que sobressaia a verdade de uma proposição. Ainda hoje, lendo as summae escolásticas permanecemos admirados com a ordem, a clareza, o nexo lógico dos argumentos e a profundidade de algumas intuições. Com linguagem técnica é atribuído a cada palavra um significado claro e, entre o crer e o compreender, estabelece-se um recíproco movimento de esclarecimento.
Queridos irmãos e irmãs, fazendo eco ao convite da Primeira Carta de Pedro, a teologia escolástica estimula-nos a estar sempre prontos a responder a quem quer que nos pergunte a razão da nossa esperança (cf. 3, 15). Ao ouvir as perguntas como se fossem nossas e assim ser capazes também de dar uma resposta. Recorda-nos que entre fé e razão existe uma amizade natural, fundada na própria ordem da criação. O Servo de Deus João Paulo II, no incipit da Encíclica
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